A União Europeia está na vanguarda da criação de mercados de comércio de emissões e da luta contra o aquecimento global. Desde 2005, possui um Sistema de Comércio de Emissões (European Union Emissions Trading System – EU ETS) e, somente entre 1990 e 2015, ganhou 90 mil km² de mata. Além disso, assumiu o compromisso de diminuir as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) em 55% (em comparação com os níveis de 1990) até 2030 e alcançar a neutralidade de carbono até 2050.
No entanto, os impactos das mudanças climáticas e os prejuízos originados pelos danos ao meio ambiente ultrapassam os limites nacionais e continentais, demandando esforços de todas as nações para solucioná-los. Dessa forma, e como uma evolução natural das fases subsequentes do ETS EU, o bloco europeu adotou uma política externa mais enfática no que tange às transações comerciais com seus estados-membro. Nesse contexto, o Carbon Border Adjustment Mechanism (em tradução livre, mecanismo de ajuste de carbono na fronteira) foi oficialmente anunciado no último mês de maio.
Tal medida fundamenta-se “nos princípios da precaução, da prevenção e da correção da poluição na fonte, bem como no princípio do ‘poluidor-pagador’“. Sendo assim, o novo regulamento obriga as entidades importadoras a pagar uma taxa para compensar os gases de efeito estufa (GEE) lançados na atmosfera durante a fabricação dos produtos adquiridos. E o pagamento será feito mediante a obtenção dos créditos CBAM, cujos valores terão como base o preço médio semanal (em €/tonelada de CO2 emitida) do leilão de permissões do European Union Emissions Trading System (EU ETS), o regime comunitário de licenças de emissão da UE. Em razão disso, os exportadores que acessam o mercado europeu deverão inventariar e informar os GEE associados aos insumos vendidos.
Em síntese, trata-se de uma estratégia para incentivar uma operação industrial mais limpa em outros lugares do mundo e assegurar isonomia no mercado internacional, a fim de que companhias estrangeiras não sejam favorecidas por não estarem sujeitas às rígidas normas impostas pelo EU ETS (evitar o chamado “vazamento de carbono”).
Vejamos os pontos-chave do CBAM, que foi concebido em conformidade com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC):
- o dispositivo contemplará os valores reais de carbono vinculados aos bens contraídos pela UE, refletindo os parâmetros do EU ETS aplicados à produção local;
- os importadores da UE precisarão comprar certificados CBAM equivalentes ao preço de carbono instituído pelo EU ETS;
- o preço de carbono pago na localidade de origem poderá ter seu custo correspondente na UE deduzido da obrigação CBAM.
Então, serão exigidas as seguintes informações:
- quantidade total de cada tipo de material;
- total das respectivas emissões diretas de GEE (Escopo 1 do Greenhouse Gas Protocol – GHG Protocol);
- total de algumas das emissões indiretas de GEE (Escopo 2 do GHG Protocol, que no Brasil é basicamente energia);
- preço de carbono no território expedidor.
Inicialmente, as recentes diretrizes ficarão restritas à comercialização de cimento, fertilizantes, eletricidade, ferro, aço, alumínio e hidrogênio. Com isso, estima-se a redução de mais de 50% dos GEE emitidos. Porém, considerando-se a mobilização em prol de uma economia descarbonizada, a probabilidade é de que mais setores sejam incorporados ao escopo do CBAM futuramente.
Cabe salientar que algumas indústrias europeias dos itens citados acima receberam parte das licenças de forma gratuitas do EU ETS, no sentido de reprimir a transferência do aparato produtivo para países sem forte legislação ambiental (“fuga de carbono” ou “carbon leakage“), o que baratearia os suprimentos importados e, por conseguinte, enfraqueceria as indústrias da Europa frente à concorrência. Contudo, ao passo que a taxação do CBAM começar a valer, esse benefício será cancelado, tendo em vista a premissa de paridade mencionada anteriormente e o estímulo à transição verde em âmbito global.
Para tanto, os procedimentos normativos serão introduzidos gradualmente, compreendendo um período de maturação e adaptação para todas as partes interessadas (compradores, vendedores e autoridades). A partir de 1º de outubro de 2023, os dados obrigatórios deverão ser coletados por trimestre, e o prazo de entrega terminará no fim de janeiro de 2024. O processo permanente terá início em 1º de janeiro de 2026, implicando declarações anuais e aquisição dos certificados CBAM, os quais serão válidos por dois anos.
De 2023 a 2024, três modelos de relatório serão aceitos: (a) completo de acordo com o método da UE; (b) baseado em sistemas nacionais compatíveis com o da UE; (c) baseado em valores de referência. Todavia, de 1º de janeiro de 2025 em diante, apenas a primeira categoria será permitida.
Ademais, com o propósito de evitar o excesso de burocracia e apoiar os empreendimentos comprometidos com a descarbonização de suas atividades, o Conselho Europeu objetiva isentar as importações com teor de carbono suficientemente baixo − configurando créditos CBAM inferiores a 150 euros − do imposto fronteiriço. Esse grupo representa cerca de um terço das remessas para a UE.
Conclui-se, portanto, que os artigos menos intensivos em carbono serão economicamente mais vantajosos e atrativos, pois encerrarão menos gastos adicionais. Além disso, se o produtor não relatar o lançamento de GEE embutido em sua mercadoria, será cobrado do importador um valor-padrão segundo a intensidade média de emissão do país exportador, incluindo um mark-up. Logo, a competitividade das organizações que negociam com a UE será bastante afetada pelo CBAM.
Consequentemente, as empresas brasileiras que não conciliarem sua atuação com os preceitos da sustentabilidade correrão o risco de perder clientes no exterior. Pra que se mantenham ou se insiram na disputa com as concorrentes, faz-se necessário inventariar as emissões de GEE e implementar um plano de mitigação eficiente e audacioso. Afinal, uma gestão ambientalmente proveitosa garantirá a dianteira nas trocas mercantis.
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